22 de dez. de 2017

A Fogueira - Krysten Ritter


Sabe quando você lê um livro e parece que você já leu aquela história em algum outro lugar? Então, A Fogueira me remeteu a dois livros.

Abby Willians livrou-se de todas as evidências de sua origem interiorana quando saiu de sua casa há dez anos, dois dias após completar dezoito anos e quatro após sua formatura no ensino médio.

Hoje, ela é uma próspera advogada especialista em direito ambiental, possui um moderno apartamento em Chicago e uma série de ficantes despretensiosos.

A vida minunciosamente construída começa a ruir quando ela e um outro advogado de sua empresa ficam responsáveis por investigar uma denuncia contra a Optimal Plastic, o coração econômico e empresa mais poderosa da pequena cidade de Barrens. 

De volta à cidade de sua infância, quase tudo e praticamente todos a lembram continuamente das coisas que aconteceram no passado enquanto e enfatizam das consequências de se procurar demais, lembranças do que ocorreu uma décadas atrás emergem, confundindo suas lembranças e minando suas certezas.

Tudo o que Abby sabe é que, em Barrens, o Jogo nunca foi somente uma brincadeira de escola.

Ao iniciar a leitura, o primeiro livro que me veio à mente foi O Coletor de Espíritos (o personagem foge de sua vida interiorana, mas é obrigado a voltar porque o passado o persegue de alguma forma), em seguida, veio a premissa de Em Águas Profundas (em que a história, por mais longe que vá, acaba sempre orbitando o mistério em volta de um desaparecimento/assassinato e que, a protagonista, devido a vários fatores traumatizantes, é desacreditada e chega as raias da loucura para conseguir que seu ponto de vista ser aceito). De "inédito", a autora às tramas a capacidade que a corrupção humana tem de piorar coisas que, por si só já são ruins o bastante.

É estranho tentar avaliar este livro: ao mesmo tempo em que gostei bastante do desenrolar da trama, o fato de ele me remeter a outros livros tão escancaradamente me desagrada, pois fico sem saber que foi uma feliz coincidência ou um caso proposital do uso de uma fórmula que dá certo. 

Uma coisa que também me incomodou um pouco neste livro foi que a revisão não me pareceu ter sido muito bem feita: há erros na formatação do texto e, ou a minha edição veio muito errada, ou há uma página inteira faltando no texto.

19 de dez. de 2017

Silas Marner, O Tecelão de Raveloe - George Eliot


Dessa vez, minha aventura literária me levou de volta à segunda metade do século XIX. 1861 para ser mais exata.

Silas Marner é um homem humilde que saiu de sua terra natal depois de ser injustamente acusado e julgado culpado por um crime que não cometeu. Decepcionado com as pessoas que o conhecem desde sempre, e mais ainda com seu melhor amigo (que foi quem armou contra ele), ele parte do vilarejo sem olhar para trás.

Em Raveloe, Silas continua seu ofício como tecelão. Decepcionado com os homens por causa da traição sofrida, ele passa a viver para o trabalho, tendo como companhia constante somente seu tear e o ouro que recebe como pagamento.

Tomado por todos na vila como "estranho" e "suspeito" somente por ser estrangeiro acentua ainda mais sua personalidade reclusa, mas ele não se importa. Para Silas, não há motivo para interações supérfluas com as pessoas da vila. 

Quando um segundo revés atinge Silas Marner, sua amargura com o mundo se aprofunda, mas é então que a chegada inesperada de uma criança, quase como se viesse para lhe substituir o ouro sumido, fará com que o tecelão reencontre a satisfação de se estar vivo.

De uns tempos para cá, o nome de George Eliot tem aparecido com certa frequência (especialmente nos meus feeds de noticia das minhas redes sociais), e por isso fiquei muito contente ao ver este livro na lista para os parceiros do Grupo Editorial Record. Infelizmente, tive problemas em praticamente toda a primeira metade dessa leitura.

Além de já não estar muito bem devido a problemas internos, os parágrafos longos me confundiam e, para ser sincera, a nuance depressiva do personagem não me ajudava em nada na hora de ler por um período de tempo mais prolongado.

Acabou que, quando a leitura finalmente se tornou mais prazerosa, já tinha passado umas boas cem páginas, que, por sinal, foram páginas e mais páginas e mais páginas cujo objetivo era, unicamente, fazer o leitor conhecer e entender Silas Marner, assim como evidenciar a dinâmica da convivência em Raveloe (páginas importantes para a história como um todo, mas que funcionam como um excelente sonífero)

Mary Ann Evans (1819 - 1880) adotou o pseudônimo masculino George Eliot para que seus trabalhos fossem levados a sério, hoje, ela é considerada uma das maiores escritoras inglesas de todas as épocas.

14 de dez. de 2017

A Peste - Albert Camus



Uma frase atribuída ao escritor Franz Kafka diz que precisamos (ou queremos) "de um livro que nos afetem como um desastre". Ao terminar A Peste lembrei-me imediatamente dessa frase.

Escrito em 1947, A Peste é ambientado em uma fictícia cidade francesa, pequena e isolada na costa argelina que, em abril de um certo ano, viu-se cenário de estranhos eventos: primeiro, começaram a surgir ratos mortos. Primeiro aos poucos, depois aos montes e, por fim, aos milhares (para se ter uma ideia, oito mil ratos mortos foram recolhidos somente no dia vinte e oito de Abril).

Até então, não se falava outra coisa além da indignação da população, exigindo que a prefeitura tomasse as medidas necessárias para limpar a cidade de tais cadáveres.

Só que a coisa não parou por aí, pois, lá meados de Maio, a doença que dizimou os ratos da cidade passou a assolar os serem humanos. A Peste estava instaurada.

A narração é feita em forma de cronica feita por um narrador que se utiliza de relatos e de documentos sobre a peste que assolou Orã. Ora acompanhando o médico que tomou a frente na organização das ações para se lidar com a doença, e ora acompanhando alguns personagens que se situavam em torno deste, A Peste é, mais uma vez se utilizando de Kafka, um machado usado para abrir um mar congelado.

O livro é seco, desprovido quase totalmente de momentos que nos aliviam dos efeitos da peste, e, mesmo assim, esses "bons momentos" não nos aliviam por completo. Eu não pude deixar de associá-lo também ao livro A Revolução de Atlas. Apesar de A Peste não ter tanto conteúdo politico, esses dois livros me pareceram dissecar a condição humana, contestando valores vigentes e desafiando o status quo.

Em uma das orelhas do livro está escrito que este é um "romance de resistência em todos os sentidos da palavra". Quando se chega ao final dessa obra, tem-se a impressão de que nada do que se definiu anteriormente como resistência chega próximo ao que se descobre ao final dA Peste.

11 de dez. de 2017

Hotelles, Quarto 2 - Emma Mars



O Quarto 1 começa em 2010 e logo em seguida retrocede para 2009.

Elle, agora de vez em dois mil e dez, fez sua escolha: deu adeus à vida de acompanhante de luxo e entregou seu corpo e seu coração ao Barlet que passou o livro anterior inteiro conduzindo Elle nos meandros de sua sexualidade.

Os dois passaram meses como amantes clandestinos no Hôtel des Charmes, em uma rotinha que consistia, basicamente entre comer, dormir e fazer sexo. 

Pronta para dar o próximo passo, Elle pede Louis em casamento, e ele recusa seu pedido alegando que ela ainda não estava preparada e que sua "formação" deveria prosseguir antes do "sim" que os uniria para sempre.

Uma série de ações pouco comuns da parte de Loius despertam, mais uma vez, o faro investigativo de Elle, que descobre que ainda há mais segredos entre os Barlet que ela pode supor, mais uma vez, envolvendo Aurore, a antiga mulher de David, que, revelando uma face vingativa, e até mesmo cruel, não desistiu de sua vingança contra o casal.

A curiosidade fica por conta de que, em algum ponto de sua investigação, nasce o projeto que culminará na publicação do Quarto 1. Eu já tinha notado a coincidência entre o nome da autora (Emma Mars) e o a residência que Louis reformou para ser sua residência (o casarão pertencera à Mademoiselle Mars), mas, até então, eu não havia realmente me atentado à possibilidade de Emma Mars ser um pseudônimo.

Foi como se esse livro redefinisse o conceito de "história erótica" que até então então eu possuía (talvez com alguma influência de Trópico de Câncer). Histórias com cenos de sexo e histórias sobre o prazer que ele pode proporcionar aos participantes (e, aqui pode-se ler: a todos os envolvidos no ato, direta ou indiretamente) são coisas diferentes que, apesar serem elementos já trabalhados em outros livros, pareceram ganhar proporções mais profundas nesta leitura.

Em algum ponto do Quarto 2 perdi a capacidade de julgar as escolhas e ações tanto de Elle quanto de Louis. O que sei agora é que a vingança de David não tardará.

8 de dez. de 2017

Trópico de Câncer - Henry Miller


De onde exatamente surgiu a minha curiosidade em ler Henry Miller é uma pergunta da qual dificilmente conseguirei responder (agora ou futuramente), mas, de qualquer maneira, nunca consegui me entender muito bem.

Trópico de Câncer é um relato autobiográfico e ficcional que tem o mérito de ter sido proibido em todos os países de língua inglesa imediatamente após sua publicação em 1934. Não é para menos também já que o autor passa mais da metade do livro falando de prostitutas, sexo e partes genitálias do corpo humano. Sério, eram, ao menos, cinco menções (ou mais) de algum desses itens por parágrafo (que, por sinal, são bem longos).

E isso em 1934.

Não à toa chegamos ao segundo mérito deste livro: lá para as bandas de 1960, nos Estados Unidos, Henry Miller passou de literatura proibida para literatura aclamada, sendo aclamado como profeta da liberdade e da revolução social e precursor do estilo subversivo, vendendo mais de dois milhões e meio de exemplares em um período de pouco mais de três anos.

Não gostei muito dessa parte (o excesso de “putas” me deixou quase com nojo do autor), mas fiquei contente (ao menos aliviada) por perceber que, depois das putas, a narrativa passou a abordar questões mais introspectivas do autor. Por incrível que pareça, essa parte fluiu muito bem e foi a parte mais gostosa da leitura.

As cenas são desconexas e não tem muita lógica na progressão da narração, e o interessante é que isso nem fez muita diferença na leitura.

Para quem se interessou pelo livro, tenha em mente de que ele não foi escrito para nossa geração. Tenha em mente que, em mil novecentos e trinta e quatro, algumas coisas eram bem mais tabus que hoje em dia.

5 de dez. de 2017

Vulgo Grace - Margaret Atwood



Como sempre digo, é preciso, no mínimo, dois livros para pode avaliar o grau de afinidade entre leitor e escritor. Às vezes tal reconhecimento vem de imediato, em outras, somente uma boa surpresa pode reverter uma compatibilidade baixa.

Ao ler O Conto da Aia, percebi que a escrita e a trama de Margaret Atwood eram habilidosas e inteligentes. É o tipo de narração que pode se passar em qualquer tempo, seja passado ou presente, e ainda assim somos capazes de encontrar paralelos impressionantes (e preocupantes) com nosso próprio tempo.

Foi assim em O Conto da Aia e também é assim neste livro, que recentemente serviu como base para a produção de uma série original na Neflix.

Vulgo Grace é uma obra de ficção baseada em um caso real ocorrido no Canadá em 1843 quando, no dia 23 de julho, Grace Marks, então com dezesseis anos, foi acusada pelos assassinatos de Thomas Kinnear e Nancy Montgomery, junto com o criado da casa James McDermott.

Não é a primeira vez que vejo isso acontecer (um escritor se apropriar de um caso ou pessoa verídicas e, a partir daí, montar uma obra de ficção), vi algo parecido no conto O Mistério de Marie Roget, de Edgar Allan Poe, mas foi a primeira vez que encarei um trabalho tão completo (o conto de Poe foi, digamos assim, uma investigação não concluída e, sob muitos aspectos, incompleto).

Grace Marks, condenada à prisão perpétua pelo assassinato de seus patrões vive, depois de ter passado por uma grande variedade de prisões e asilos, em uma penitenciaria Kingston, no Canadá. Sua personalidade dócil (e a fama de assassina) lhe renderam o privilégio de passar os dias trabalhando como criada na casa do governador do presídio, e também a simpatia de personalidades importantes da cidade, como clérigos, médicos e políticos.

Esse grupo, liderado pelo reverendo Verringer, tenta a anos aprovar uma petição a favor de Grace, e contratam o doutor Simon Jordan, um jovem médico estudioso de doenças mentais, para avaliar Grace e, quem sabe, adicionar um parecer favorável a ela no próximo pedido de perdão.

É assim que conhecemos a história dessa que se tornou uma das mulheres canadenses da década de mil oitocentos e quarenta: ela contando sua história (ou o que se lembra dela) ao doutor Jordan enquanto este faz suas anotações. Junto à narração dela, há trechos de jornais da época sobre o caso e trechos de literatura que se relacionam (direta ou indiretamente) com o tema, além de cartas trocadas entre o doutor Jordan e alguns correspondentes e também partes em que ele próprio assume a narração.

A princípio, a história é bem simples, e aparentemente nada relacionado ao que se passa no mundo atual mas, quando você pensa que não, surge uma situação ou uma fala que você acaba tendo que para pensar se aquilo realmente se limita a um contexto geral no século XIX ou se estamos falando de nosso próprio tempo, e acho que é justamente nisso que reside o brilhantismo de Atwood.

É uma leitura intensa, pouco recomendada para períodos muito curtos de tempo, ainda assim, muito recomendada (até porquê duvido que uma adaptação consiga transmitir tantos detalhes quanto a obra que a inspirou).

E já coloquei outro livro de Atwood na minha lista de desejados.